segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Já correu muita água em Marte e o cascalho de um aluvião prova-o

Texto de Teresa Firmino publicado pelo jornal Público, em 29/09/2012

"As primeiras provas directas de que a água foi abundante no planeta vermelho acabam de chegar à Terra. Os seixos, mais ou menos arredondados, mostram que essas correntes foram frequentes

Cascalho e rochas em Marte ( à esquerda) e na Terra (à direita), em que a água desempenhou um papel importante
Encosta abaixo, correntes de água arrastaram lama, areias e cascalho. O cascalho foi ficando arredondado, limado pela água ao longo dos anos. Podia ser o cenário de uma qualquer paisagem na Terra onde os aluviões são frequentes — mas não, passou-se em Marte e as câmaras do robô deram agora a ver pela primeira vez esses vestígios.
Já houve provas geológicas da existência passada de água em Marte, mas nunca como estas, diz a agência espacial NASA. Estas imagens não só mostram cascalho solto, como rochas feitas de blocos que cimentaram entre si — e isso é que é inédito.
“Pelo tamanho do cascalho transportado, podemos dizer que a água corria a cerca de um metro por segundo, com uma profundidade que ia entre o tornozelo e a anca”, explica um dos cientistas da missão do
William Dietrich, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, nos EUA. “Muitos artigos têm sido escritos sobre os canais em Marte, com muitas hipóteses sobre as suas correntes. Esta é a primeira vez que realmente vemos em Marte cascalho transportado pela água. Isto representa a passagem da especulação sobre o tamanho dos materiais no leito de correntes de água para a sua observação directa.”
Também Rebecca Williams, outra cientista da missão, frisa a importância dos resultados: “Estas provas concretas sobre a gravilha transportada por água em Marte são maravilhosas. É muito entusiasmante ter a confirmação no terrenos de hipóteses formuladas com dados obtidos em órbita.” E acrescenta: “As formas [do cascalho] dizem-nos que foi transportado e os tamanhos que não podem ter sido transportados pelo vento, mas por correntes de água.”
O robô chegou ao solo marciano no início de Agosto, com um propósito — procurar provas geológicas de água em abundância no passado do planeta. Ao seguir o rasto da água, considerada essencial à vida, os cientistas esperaram descobrir a resposta para uma pergunta constante sobre Marte: será que já teve vida, ainda que só microscópica?
Agora, enquanto caminha para o seu alvo principal em Marte, o monte Sharp, no meio da cratera Gale, o Curiosity já encontrou as primeiras provas de enxurradas marcianas.
Obteve-as nas rochas de dois afloramentos formadas num aluvião situado entre o bordo norte da cratera e o sopé do monte Sharp. A partir da encosta da cratera, a água arrastou lama, areias e cascalhos, formando este aluvião em forma de leque. E o resultado foi uma rede de pequenos canais na encosta, que, pela abundância, mostra a frequência das correntes. Até quando aconteceram estas enchentes é agora uma questão para a qual se procura resposta.
Além da gravilha, nos afloramentos há conglomerados, uma rocha formada por blocos, uns mais arredondados, outros mais angulosos, uns do tamanho de grãos de areia, outros de uma bola de golfe, que acabaram ligados entre si.

Os famosos canais de Marte, que tanto furor causam desde o final do século XIX, existem mesmo e, afinal, foi a natureza que os criou. "

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