quinta-feira, 25 de julho de 2013

Alterações climáticas podem levar lince-ibérico à extinção neste século

Texto de Nicolau Ferreira publicado pelo jornal Público em 22/07/2013
Modelo mostra que nas próximas décadas o Sul da Península Ibérica deixará de ter condições para o felino mais ameaçado da Terra. Paradigma de conservação tem de mudar para salvar a espécie, defende estudo
O lince-ibérico tem cerca de um metro de comprimento e 70 centímetros de altura
O lince-ibérico é o felino que está mais próximo da extinção. Na última década, o número de animais não ultrapassava na natureza a centena e meia. Em Portugal, avistar um deles passou a estar no patamar dos sonhos, com uma ou outra excepção. Os imensos esforços de conservação reverteram, para já em Espanha, esta tendência e a população de linces tem aumentado. Mas de acordo com um novo estudo, este esforço não chega. As alterações climáticas podem mudar, em poucas décadas, as paisagens do Sul da Península Ibérica e tornar inviáveis as regiões onde hoje o felino tem condições para viver: se nada for feito, o lince desaparecerá da face da Terra ainda neste século, avança um artigo publicado agora na revista Nature Climate Change.
 
"As alterações climáticas vão rápida e severamente diminuir a abundância do lince e provavelmente levar à extinção da espécie na natureza dentro de 50 anos, mesmo que haja um forte esforço global de mitigar as emissões de gases com efeito de estufa", avança o artigo da equipa internacional que conta com dois portugueses.
 
A equipa teve em conta os cenários anuais do clima futuro na Península Ibérica fornecidos pelo Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas das Nações Unidas, mas cruzou esses dados com a ecologia das populações de lince-ibérico e coelho-selvagem. "A maior parte dos modelos aborda as alterações climáticas e os solos, nunca aborda as interacções bióticas", explica ao PÚBLICO Miguel Araújo, coordenador do estudo e que divide o seu tempo entre a Universidade de Évora e o Museu Nacional de Ciências Naturais de Madrid.
 
Para sobreviver na natureza, o lince-ibérico (Lynx pardinus) está dependente do coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus), que perfaz 90% da alimentação do felino. Nas últimas décadas, o coelho tem-se debatido com duas doenças que dizimaram as populações. Além disto, a diminuição do habitat disponível, a caça e uma terceira doença que afecta o lince-ibérico têm sido fatais para este felino. A área do lince reduziu 33 vezes entre 1950 - quando existiam mais de 5000 animais na Península Ibérica - e 2005. Neste ano, já só ocupava 1200 quilómetros quadrados, em Espanha. E as alterações climáticas podem dar o golpe de misericórdia, se nada for feito. "Se houver menos pluviosidade [um dos efeitos esperados para o Sul da Península Ibérica], há menos vegetação e menos coelhos", diz o biogeógrafo. "Menos coelhos implica menos linces."
 
O artigo mostra que, na melhor das hipóteses - tendo em conta a conservação actual que só contempla a reintrodução da espécie no Sul e uma mitigação agressiva da emissão de gases com efeito de estufa -, o lince-ibérico tem 89% de probabilidades de extinção. O que ocorrerá por volta de 2065. Apesar de os modelos não incluírem todos os aspectos, "a mensagem qualitativa da extinção nas próximas décadas é robusta", diz o investigador português.
 
Mas há uma alternativa. "Está nas nossas mãos assegurar a continuação da espécie, só que isso exige uma alteração de paradigma", defende o biogeógrafo. "Se tivermos uma política de reintrodução do lince-ibérico tendo em conta critérios geográficos e ambientais, poderemos esperar um aumento da população até aos 800 indivíduos [no final do século]."
 
Atendendo a esses novos critérios, o lince-ibérico deveria ser introduzido em várias zonas mais a norte da Península Ibérica, como a meseta ibérica, a costa da Catalunha, a zona perto dos Pirenéus e ainda na Beira Alta, a Beira Baixa e Trás-os-Montes. Todos estes locais, onde o lince-ibérico já existiu no passado, vão ter no futuro as condições climáticas para o coelho e o lince viverem.
 
"A mensagem mais geral é que as políticas de conservação têm de passar a considerar as mudanças de paisagem devido às alterações climáticas", resume o cientista.
 
Para Eduardo Santos, da Liga para a Protecção da Natureza e um dos coordenadores do Projecto LIFE Lince Moura/Barrancos - um dos potenciais locais onde o lince poderá ser reintroduzido em Portugal -, este artigo é importante quando se pensa na conservação a médio prazo deste felino. "O tempo e o investimento para fazer a conservação é grande e depende do esforço de diferentes entidades, não só das da conservação mas de proprietários, agricultores, caçadores e da sociedade em geral", considera. "A reintrodução sozinha não tem sucesso", diz.
 
Mas Eduardo Santos concorda com esta nova equação que inclui os efeitos das alterações climáticas: "Enquanto novo paradigma, faz todo o sentido."

Golfinhos-roazes chamam-se uns aos outros pelo "nome"

Texto de Marina Soares publicado pelo jornal Público em 23/07/2013
Estudo conduzido por investigadores de uma universidade escocesa conclui que os golfinhos só respondem ao som que os identifica dentro do grupo.
Golfinhos-roazes usam sons que só são reconhecidos dentro do grupo
Um grupo de investigadores da universidade escocesa de St. Andrews analisou os sons emitidos pelos golfinhos roazes e concluiu que estes se chamam uns aos outros pelo “nome”. Estes animais são, ao que parece, os únicos mamíferos não-humanos a usar sons individuais para comunicar com cada um dos membros do grupo.
 
O estudo, publicado nesta segunda-feira na revista Proceedings of the National Academy Scientes (PNAS), conclui que os golfinhos respondem quando ouvem o seu próprio assobio reproduzido. “Os animais não respondem a assobios que não sejam a sua própria assinatura”, lê-se no resumo publicado na página de Internet da revista.
 
Já se acreditava que os golfinhos utilizavam sons distintos para se identificarem e que aprendiam a imitar os sons pouco habituais, de uma forma semelhante aos nomes utilizados pelos humanos. Mas esta é a primeira vez que se estuda a resposta dos animais ao seu próprio “nome”.
 
Para a investigação, os cientistas gravaram os sons produzidos por um grupo de golfinhos roazes (Tursiops truncatus) selvagens e captaram o som que identificava cada um dos animais. Em seguida, reproduziram os sons usando altifalantes subaquáticos, misturando também assobios identificativos de populações diferentes. Perceberam que cada animal só respondia ao seu próprio assobio, imitando-o.
 
Os investigadores afirmam que esta capacidade, tipicamente humana, deverá ter sido desenvolvida para ajudar os animais a manterem-se unidos no seu vasto habitat aquático.
 
“Na maior parte do tempo, eles não se vêem, nem conseguem usar o olfacto debaixo de água, sendo que este é um sentido muito importante para se reconhecerem”, explicou ao jornal espanhol El País o investigador Vincent Janik, da unidade de investigação de mamíferos marinhos da universidade de St. Andrews ."Os golfinhos também não costumam ficar num local específico, pelo que não têm tocas nem ninhos onde regressar", lembrou. Daí que utilizem os sons para se chamarem e se reconhecerem dentro de água.

NASA revela novas imagens do “pontinho azul-claro” (a Terra) visto de muito longe

Texto de Ana Gerschenfeld publicado pelo jornal Público em 23/07/2013
A cores e a preto e branco, foram apanhadas por duas sondas espaciais na última sexta-feira – e mostram, como bónus, um diminuto pontinho branco: a Lua.
Imagem em bruto da Terra e da Lua captada pela sonda Cassini
Imagem a preto e branco da Terra e da Lua captada pela sonda Messenger
 
A Terra e a Lua, a cores, captadas pela sonda Cassini
 
A sonda Cassini, actualmente em órbita de Saturno, virou há uns dias a sua câmara de mais alta resolução na nossa direcção e captou imagens a cores da Terra e da Lua, anunciou esta terça-feira a agência espacial norte-americana NASA em comunicado.
 
A sonda é um projecto conjunto da NASA, da Agência Espacial Europeia (ESA) e da Agência Espacial Italiana.
 
As fotografias, que foram captadas a 1500 milhões de quilómetros de distância de nós, são as primeiras da sonda Cassini que conseguem mostrar o nosso planeta e o seu satélite natural como dois objectos distintos, explica a NASA.
 
Uma das imagens agora divulgadas (a primeira das várias que acompanham este texto) teve de ser ampliada cinco vezes, a luminosidade tanto da Terra como da Lua aumentada – e a luminosidade da Lua ainda mais aumentada em relação à da Terra para a Lua ser visível. A imagem mostra o nosso “pontinho azul-claro” e o seu único “companheiro” mergulhados na imensa escuridão do espaço.
 
Pelo seu lado, a sonda Messenger, concebida e construída pela Universidade Johns Hopkins (EUA), em órbita de Mercúrio, captou uma imagem a preto e branco a 98 milhões de quilómetros de distância de nós.
 
É a terceira vez que a Terra nos surge vista dos confins do sistema solar. A primeira sonda a “olhar para trás”, a 14 de Fevereiro de 1990, foi a Voyager 1 da NASA, que na altura se encontrava a mais de seis mil milhões de quilómetros da Terra, para lá de Plutão, a caminho do resto do Universo. A ideia de virar as câmaras daquela sonda para a Terra foi do famoso astrónomo norte-americano Carl Sagan – e deu origem à mítica imagem que valeu ao nosso planeta a alcunha de “pontinho azul-claro”, também da autoria de Sagan.

Um só gene da palmeira-de-óleo explica espessura diferente da casca do fruto

Artigo publicado pelo jornal Público em 25/07/2013
Descodificado o genoma da planta que é a principal fonte de óleo comestível do mundo.
A forma espessa (à esquerda) e pouco espessa da casca do fruto
A descodificação do genoma da palmeira-de-óleo, revelada na última edição da revista Nature, permitiu identificar um gene que poderá revelar-se essencial para aumentar o rendimento e aliviar a pressão sobre as florestas tropicais.
 
A palmeira-de-óleo é cultivada pelos seus frutos, de onde se extrai o óleo de palma, a gordura vegetal mais consumida em todo o mundo. Não só é a principal cultura oleaginosa a nível mundial (33% da produção de óleo vegetal e 45% da produção de óleo comestível), como é a mais produtiva (dá cinco a sete vezes mais óleo do que o amendoim e dez vezes mais do que a soja).
 
Para fazer face às crescentes necessidades mundiais de óleo de palma, devido à procura da indústria agro-alimentar e dos biocombustíveis, a área cultivada de palmeiras-de-óleo aumentou consideravelmente nos últimos anos, sobretudo no Sudeste asiático, em detrimento da floresta. A enorme expansão da cultura da palmeira-de-óleo enfrenta um duplo problema de imagem: é acusada de destruir florestas e ameaçar a saúde humana originando produtos prejudiciais ao sistema cardiovascular.
 
Agora, investigadores do Painel Malaio para o Óleo de Palma (MPOB, na sigla inglesa), uma agência governamental para apoiar este sector agro-industrial da Malásia, o segundo maior produtor mundial depois da Indonésia, apresentaram dois artigos na revista Nature sobre a descodificação do genoma das duas espécies principais que dão o óleo de palma – a palmeira-de-óleo-africana (Elaeis guineensis), também conhecida por palmeira-dendém ou dendezeiro e que é originária da África Ocidental, e a palmeira-de-óleo-americana (Elaeis oleifera), da América latina.
 
Os investigadores identificaram um único gene – chamado Shell – que determina quão dura é a casca do fruto. Mutações neste gene explicam a existência de três variedades de palmeiras, em função da espessura da casca: o tipo dura, com uma casca espessa, o tipo pisifera, sem casca mas que geralmente não produz fruto, e o tenera, um híbrido dos dois tipos que tem a casca fina.
 
Na forma tenera, existe uma versão normal do gene Shell e uma versão mutada, uma combinação óptima que se traduz numa produção de óleo por fruto 30% superior ao do tipo dura.
 
Como as palmeiras-de-óleo tem um ciclo de reprodução muito longo, os agricultores têm de esperar até seis anos para determinar qual dos três tipos de fruto uma planta irá produzir. Na sequência da identificação do gene Shell, o desenvolvimento de um marcador genético permitirá acelerar o processo de selecção das plantas e diminuir as áreas cultivadas.
 
“Esta descoberta poderá ajudar a conciliar os interesses divergentes entre a crescente procura mundial de óleo alimentar e os biocombustíveis, de um lado, e a preservação da floresta por outro”, considera um dos autores do trabalho, Rajinder Singh, do MPOB.

Segredo de uma vida longa pode estar em ingerir menos calorias

Artigo publicado pelo jornal Público em 17/07/2013
Experiência de equipa chinesa em ratinhos mostrou que redução das calorias influencia as bactérias intestinais.
O número de calorias parece ser mais importante do que o facto de o alimento ser ou não rico em gordura
Restringir a quantidade de alimentos ingeridos pode ser a chave para uma vida prolongada, segundo dados de uma equipa de cientistas chineses que acabam de publicar um estudo na revista científica Nature Communications.
 
A equipa da Universidade de Jiao Tong, em Xangai, explica que fez uma série de experiências em 150 ratinhos ao longo de três anos e que foi possível estabelecer uma relação entre comer pouco e viver mais tempo nos ratinhos que foram sujeitos a uma restrição das calorias ingeridas por dia.
 
Zhao Liping, coordenador do estudo e investigador da Escola de Biotecnologia e Ciências da Vida da universidade chinesa, em declarações ao jornal Shanghai Daily, citado pela Lusa, adiantou que as conclusões se podem aplicar a outros animais e também a humanos – ainda que sejam necessárias investigações adicionais já que os resultados em pessoas devem ser personalizados. Além disso as experiências decorreram apenas em ratinhos machos, já que o sexo poderia ser um factor que poderia influenciar os resultados.
 
De acordo com o cientista, a restrição calórica favorece a expansão da flora bacteriana saudável presente no sistema digestivo, nomeadamente os lactobacilos, o que ajuda a combater e a reduzir o número de bactérias nocivas para o organismo. Zhao assegura que estas bactérias “boas” são um elemento determinante na saúde e tempo de vida.
 
“A restrição de calorias é o único regime experimental que pode alargar de maneira eficaz o tempo de vida em vários modelos de animais, mas o mecanismo que torna isso possível continua a ser controverso”, diz o artigo, que sublinha que os “microorganismos intestinais têm um papel essencial na saúde dos seus hospedeiros” e a sua estrutura deriva da forma como comemos.
 
“Os microbióticos do intestino mostraram que têm um papel pivô na saúde do hospedeiro e que a sua estrutura é sobretudo formada pela dieta. Com este estudo mostramos que uma dieta prolongada de restrição calórica tanto com muita como com pouca gordura, mas sem exercício voluntário, muda significativamente toda a estrutura dos microbióticos”, lê-se no estudo.
 
Segundo o artigo, as conclusões são válidas tanto para dietas com muitas ou com poucas gorduras, já que o que parece contar é o total de calorias ingeridas. Os ratinhos que foram sujeitos a uma dieta com cerca de menos 30% de calorias mostraram também uma redução de uma toxina associada a inflamações, a lipopolissacarídeo. E refere-se, também, que dados prévios em humanos já mostravam diferenças nas bactérias de quem tem uma dieta ocidental moderna ou mais rural.
 
Zhao Liping e os restantes cientistas acreditam que o trabalho que acabam de publicar traz importantes conclusões para outras investigações que estão a ser feitas sobre obesidade, as suas causas e efeitos, assim como para outras doenças do metabolismo.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Invasão de algas pintou de verde o mar Amarelo na China

Artigo publicado pelo jornal Público em 05/07/2013.
Fenómeno não é novo, mas este ano atingiu dimensões nunca antes vistas.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A maior invasão de algas jamais registada na China cobriu com um manto verde o mar Amarelo, que banha a cidade de Qingdao, na província de Shandong. O fenómeno não é novo, mas este ano atingiu dimensões nunca vistas.
 
Segundo o jornal britânico The Guardian, que cita a agência de notícias chinesa Xinhua, as autoridades foram obrigadas a utilizar bulldozers para retirar mais de 7300 toneladas de algas das praias.
 
As algas, da espécie Enteromorpha prolifera, não são tóxicas para pessoas ou animais. No entanto, podem alterar o ecossistema onde se inserem, bloqueando a entrada de luz solar na água e absorvendo o seu oxigénio, o que acaba por asfixiar os organismos marinhos.
 
O fenómeno tem ocorrido anualmente nos últimos seis Verões, naquela cidade. Este ano, as algas estenderam-se por quase 28 mil quilómetros, duas vezes mais do que em 2008. Nesse ano, Qingdao acolheu as provas de vela inseridas nos Jogos Olímpicos de Pequim, que estiveram em risco precisamente devido à enorme quantidade de algas no mar Amarelo.
 
Uma especialista contactada pelo The Guardian admite que esta invasão se deve à poluição. “A proliferação explosiva de algas costuma ocorrer após descargas maciças de fosfatos e nitratos na água. Pode ser da agricultura, de esgotos não-tratados ou de algum tipo de indústria que esteja a descarregar resíduos na água”, afirmou Brenda Parker, investigadora da Universidade de Cambridge.

E a 14ª lua de Neptuno foi descoberta

Texto de Teresa Firmino publicado pelo jornal Público em 16/07/2013.
Tem 19 quilómetros de diâmetro, está a cerca de 150 mil quilómetros do seu planeta e demora apenas 23 horas a orbitá-lo.
Imagem compósita de várias observações do telescópio Hubble, com a nova lua S/2004 N1
É tão pequena que a sonda Voyager 2 não deu por ela, quando passou perto de Neptuno em 1989, na sua viagem pelo sistema solar e agora a caminho do espaço interestelar. A 14ª lua descoberta em órbita de Neptuno tem apenas 19 quilómetros de diâmetro. Nome?Os cientistas chamaram-lhe S/2004 N 1.
 
Mark Showalter, do Instituto SETI, em Mountain View, na Califórnia, estava a analisar imagens de arquivo do telescópio espacial Hubble, para estudar os ténues anéis de Neptuno. Como as luas de Neptuno e anéis orbitam muito rapidamente o planeta, foi preciso gizar uma maneira de seguir o seu movimento para fazer sobressair os pormenores deste sistema, conta o investigador, num comunicado da NASA. “É o que acontece com um fotógrafo desportivo que segue um atleta a correr – o atleta fica focado, mas o ambiente à volta está desfocado.”
 
O investigador decidiu alargar a análise das imagens do Hubble a regiões muito para lá do sistema de anéis de Neptuno – e foi então que a 1 de Julho último detectou um minúsculo ponto branco, a cerca de 150 mil quilómetros do planeta, entre as luas Larissa e Proteu.
 
O mesmo ponto branco aparecia repetidamente em imagens do Hubble tiradas entre 2004 e 2009, como pôde verificar. Quando a Voyager 2 visitou Neptuno, viu uma tempestade do tamanho da Terra, encontrou seis novas luas e visitou Tritão, a maior lua de Neptuno, quase do tamanho da nossa Lua e onde descobriu géisers de azoto, mas a S/2004 N 1 passou-lhe despercebida.
 
Agora sabemos que faz parte do séquito de Neptuno como a sua mais pequena lua conhecida, que completa uma volta ao planeta em apenas 23 horas.

Estrela que irá ter 100 vezes a massa do Sol apanhada a nascer

Texto de Teresa Firmino publicado pelo jornal Público em 10/07/2013.
Novo radiotelescópio no Chile observou o interior de nuvem de poeiras e gases na nossa galáxia onde está a formar-se uma estrela gigantesca. Ela vai nascer, viver e morrer depressa, como um buraco negro.
O núcleo amarelo é o "útero" estelar onde está a formar-se a nova estrela numa nuvem de gases e poeiras, a 11.000 anos-luz da Terra
Como nascem as estrelas de grande massa, aquelas que têm pelo menos dez vezes a massa do Sol? Uma equipa internacional, que inclui a astrofísica portuguesa Ana Duarte Cabral, apanhou o maior embrião de uma estrela alguma vez visto a formar-se na nossa galáxia e que já deu pistas aos cientistas sobre o assunto.
 
A estrela é uma das que estão a nascer na Via Láctea, dentro da Nuvem Escura de Spitzer 335.579-0.292, um grande aglomerado de poeiras e gases que não deixa passar a luz visível. A zona da nuvem escura onde esta estrela se encontra em formação é como um grande útero estelar, com 500 vezes a massa do Sol, e é aí que a estrela está a alimentar-se vorazmente enquanto cresce. No final da sua formação, deverá atingir 100 vezes a massa do Sol, o que é muito invulgar. Não se conhecem estrelas com muito mais de 100 massas solares e mesmo com mais de 50 já são raras.
 
Ora, para conseguir ver o interior desta nuvem escura, como se de uma ecografia se tratasse, a equipa utilizou o maior radiotelescópio da Terra, o ALMA, inaugurado no Chile em Março. Tudo porque o ALMA, da sigla em inglês de Atacama Large Millimeter/submillimeter Array, observa outro tipo de radiação, com comprimentos de onda maiores do que a luz visível, por volta do milímetro, o que permitiu observar o interior desta nuvem opaca, situada a cerca de 11.000 anos-luz de distância da Terra.
 
Outros telescópios espaciais, o Spitzer, da NASA, e o Herschel, da Agência Espacial Europeia, já tinham antes dado a ver que o ambiente dentro da nuvem era conturbado, com filamentos de gás escuros e densos. Mas o poder do ALMA permitiu observações mais minuciosas, quer ao nível da quantidade de poeiras quer do gás a deslocar-se dentro da nuvem, sublinha um comunicado do Observatório Europeu do Sul (ESO), organização intergovernamental de astronomia a que Portugal pertence e que é um dos parceiros do radiotelescópio.
 
Fragmentação ou colapso total?
Estas observações trazem agora novas pistas sobre a formação de estrelas de grande massa. Há duas hipóteses, explica ainda o comunicado. Uma sugere que a nuvem escura progenitora se fragmenta, criando vários núcleos pequenos de matéria, que entra em colapso sobre si própria, acabando por formar várias estrelas. A outra hipótese sugere que a nuvem inteira entrará em colapso, com o material a deslocar-se rapidamente para o centro da nuvem, criando nessa região uma ou mais estrelas de massa muito elevada.
 
“As observações do ALMA permitiram-nos ver pela primeira vez com todo o pormenor o que se passa no interior desta nuvem,” diz o coordenador da equipa, Nicolas Peretto, da Universidade de Cardiff, no Reino Unido. “Queríamos ver como é que estrelas monstruosas se formam e crescem, e conseguimos! Uma das fontes que encontrámos é um verdadeiro gigante – o maior núcleo proto-estelar alguma vez encontrado na Via Láctea.”
 
Neste núcleo, o útero da estrela embrionária, muita matéria continua a juntar-se. A gravidade fará o seu trabalho e todo esse material cairá sobre si próprio, formando uma estrela com uma quantidade de matéria invulgar. “As observações do ALMA revelam os detalhes espectaculares dos movimentos da rede de filamentos de gás e poeiras e mostram que uma enorme quantidade de gás está a deslocar-se para a região central compacta”, explica por sua vez Ana Duarte Cabral, 28 anos, actualmente no Laboratório de Astrofísica da Universidade de Bordéus, em França, como pós-doutorada.
 
Estas observações apoiam assim a hipótese do colapso global para a formação de estrelas de grande massa, em vez da hipótese da fragmentação, remata o comunicado.
 
“Embora já soubéssemos que esta região era uma boa candidata a ter uma nuvem a formar estrelas de grande massa, não esperávamos encontrar uma estrela embrionária tão grande no seu centro. De todas as estrelas da Via Láctea, apenas uma em cada dez mil atinge este tipo de massa [100 massas solares]!”, sublinha Peretto.
 
Com esse “tamanho”, se a colocássemos no nosso sistema solar, até onde chegaria ela? “Para já, o que observámos foi o núcleo que poderá dar origem a uma tal estrela, que neste momento ainda está em crescimento. O núcleo em si tem cerca de 10.000 unidades astronómicas, ou seja, 10 mil vezes a distância da Terra ao Sol, pelo que o tamanho deste núcleo é maior do que o sistema solar inteiro”, responde ao PÚBLICO Ana Duarte Cabral. “No entanto, quando a estrela for adulta e parar de crescer, se atingir as tais 100 massas solares, terá um raio que será cerca de 30 vezes maior que o raio do Sol. Mesmo assim, esta distância corresponde a menos do que a distância entre Mercúrio e o Sol. Seria uma estrela 30 vezes maior (em raio) do que o Sol, mas não chegaria a nenhum dos planetas.”
 
Nascer e morrer depressa
Mas estrelas como esta nascem, crescem e morrem depressa. “Não são apenas raras, o seu nascimento é também extremamente rápido e a sua infância muito curta. É por isso que encontrar um objecto com tanta massa numa fase tão inicial da sua evolução é um resultado espectacular”, acrescenta outro elemento da equipa, Gary Fuller, da Universidade de Manchester, no Reino Unido, que foi o orientador da tese de doutoramento de Ana Duarte Cabral.
 
Esta fase precoce do nascimento de uma estrela maciça demora cerca de um milhão de anos. “Uma vez adulta, penso que viverá qualquer coisa como cinco milhões de anos. Pode parecer muito para nós, mas comparado com estrelas como o Sol, que duram cerca de 9000 milhões de anos, é muito curto”, diz-nos ainda a astrofísica portuguesa. “O facto de as estrelas maciças serem raras e evoluírem tão depressa é que as torna tão difíceis de observar.”
 
Quando o seu fim chegar, ela tornar-se-á um buraco negro, refere Ana Duarte Cabral. “Só as estrelas maciças acabam a vida de forma tão dramática.”

Sem terapia hormonal da menopausa, terão morrido 50 mil mulheres nos EUA

Texto de Ana Gerschenfeld publicado pelo jornal Público em 19/07/2013.
Desde 2002 que um estudo nos EUA sobre os supostos perigos das terapias hormonais causa estragos.
Uma equipa de cientistas norte-americanos fez uma estimativa do número de mulheres com 50 a 59 anos de idade que morreram nos EUA, nos últimos dez anos, porque após uma cirurgia de remoção do útero não receberam o tratamento hormonal que lhes poderia ter poupado a vida. Os seus resultados foram publicados online ontem pela revista American Journal of Public Health.
 
Nos anos 1990, as mulheres que sofriam histerectomias (remoção do útero) recebiam a seguir um tratamento com estrogénios, uma das duas hormonas sexuais femininas, para travar o declínio cardiovascular e ósseo associado a essa menopausa induzida - e evitar afrontamentos, suores nocturnos, depressão... Mais de 90% dessas mulheres faziam estes tratamentos nos EUA.
 
Mas em 2002, tudo foi por água abaixo quando um grande estudo sobre a saúde das mulheres, o WHI (Women"s Health Initiative) foi interrompido por ter sido alegadamente observado um aumento do risco cardiovascular e de cancro da mama nas mulheres com menopausa que tomavam combinações de estrogénios e de progesterona, a "outra" hormona sexual feminina (nas mulheres com útero, dá-se progesterona para evitar o risco de cancro do útero associado aos estrogénios).
 
O pânico gerado entre as utilizadoras destas terapias e os seus médicos foi tal que, ainda hoje, apenas 10% das norte-americanas recorrem a terapias de "substituição hormonal". A repercussão em países europeus como França também foi gigantesca, com uma quebra de 80% das utilizadoras já em 2007. Em Portugal não há dados disponíveis, mas o mais provável é que o impacto tenha sido da mesma ordem.
 
Desde então, os próprios autores do estudo norte-americano foram desmentindo as suas conclusões de 2002. Sabe-se hoje que os resultados aparentemente negativos para a saúde daquele estudo apenas se aplicavam a um medicamento específico chamado Prempro (que, já agora, não era utilizado na Europa). E esses mesmos autores também já publicaram resultados que indicam que, nas mulheres sem útero, a utilização de estrogénios até reduz o risco de cancro da mama.
 
Em França, Marianne Canonico e colegas do INSERM (Instituto francês da Saúde e da Investigação Médica) mostraram, em 2007, que os estrogénios transdérmicos não aumentavam o risco de trombose e que o risco associado à progesterona dependia do tipo de progesterona utilizada. Outros cientistas franceses obtiveram resultados semelhantes em relação ao risco de cancro da mama.
 
Mas isso não tem impedido a "aversão" às hormonas de continuar a ser a atitude dominante. E as consequências dessa atitude não fundamentada mas persistente têm sido, como escrevem agora Philip Sarrel e colegas, da Universidade de Yale, "letais", nomeadamente para o grupo de mulheres que perdeu o útero. "O facto de evitar os tratamentos com estrogénios resultou num custo real em vidas de mulheres durante os últimos dez anos - e as mortes continuam a acontecer", diz Sarrel, citado em comunicado da universidade. "Esperamos que o nosso artigo force finalmente o necessário debate e faça aumentar a receptividade aos benefícios para a saúde da terapia de estrogénios para as mulheres na casa dos 50 anos que já não têm útero."
 
Para obter as estimativas, os cientistas recorreram a dados do Censo norte-americano, a dados sobre taxas de histerectomias na população e a estimativas do declínio da utilização de hormonas pelas mulheres com 50 a 59 anos de idade entre 2002 e 2011. E os números a que chegaram são aterradores: no cenário mais "optimista", as vítimas terão sido à volta de 18.500; no mais brutal, 91.500. O mais provável é que tenham sido perto de 50 mil - e também é provável que os números seriam maiores se tivessem tido em conta as mulheres sem útero com menos de 50 anos. A maioria destas mortes prematuras e desnecessárias foram devidas a doenças cardiovasculares e quase todo o resto a cancros da mama.
 
Os autores escrevem palavras muito duras: "É da responsabilidade dos cientistas biomédicos relatar os seus resultados de forma a que os media e o público em geral os possam facilmente perceber. (...) É também da responsabilidade dos media e dos médicos transmitir essa informação de forma a que seja claramente compreendida. A distorção dos pormenores pode revelar-se nada menos do que letal. (...) O facto de não ter havido distinções claras entre as diversas populações de mulheres e os diversos tipos de tratamentos hormonais tem custado milhares de vidas."

Investigação em células estaminais no Biocant resultou em cinco patentes em dois anos

Artigo da LUSA publicado pelo jornal Público em 19/07/2013.
Parque tecnológico em Cantanhede tem conseguido alguns avanços para aplicações clínicas e novos fármacos com células capazes de regenerar tecidos e órgãos.
O Biocant acolhe nesta sexta-feira o Encontro Internacional em Células Estaminais para Rastreio de Fármacos e Medicina Regenerativa
A investigação em células estaminais (do cordão umbilical) no parque tecnológico Biocant, em Cantanhede, resultou, nos últimos dois anos, em cinco patentes, duas delas já licenciadas a empresas, disse o investigador Lino Ferreira.
 
As duas patentes estão relacionadas com aplicações clínicas e uma terceira está “em vias de dar origem a um projecto empresarial” no âmbito do rastreio e criação de novos fármacos. As duas patentes restantes, indicou, estão em fase de ver identificado qual o melhor método de exploração.
 
Lino Ferreira, investigador do Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra é um dos especialistas que participam, sexta-feira, no Biocant, no Encontro Internacional em Células Estaminais para Rastreio de Fármacos e Medicina Regenerativa.
 
O investigador afirmou que o encontro “vai debater o ‘estado da arte’ da investigação a nível mundial” em células estaminais. Uma das linhas de debate, disse Lino Ferreira, diz respeito à utilização das células estaminais na identificação de novos fármacos, nomeadamente em doenças cardiovasculares, “área em que houve desenvolvimentos recentes”, nomeadamente na avaliação toxicológica.
 
A aplicação no âmbito da medicina regenerativa, para regeneração de tecidos e órgãos é outro dos pontos em debate, concretamente a necessidade “de levar as células [no corpo humano] aos sítios onde são necessárias”. “Quando são injectadas no sangue temos de as conseguir levar para o sítio certo, para não se perderem na via sanguínea. E essa necessidade está a ser explorada e investigada”, explicou Lino Ferreira.
 
“Como originar células estaminais?” é a terceira questão que será debatida na reunião, com a discussão científica centrada em saber se aquele tipo de células indiferenciadas (que têm capacidade de gerar outros tipos de células existentes no organismo) se resume às existentes no corpo humano ou se podem ser criadas a partir de células adultas, diferenciadas.
 
Para além de Lino Ferreira, o encontro contará com a presença de outros investigadores nacionais como Pedro Granja (Instituto de Engenharia Biomédica - Universidade do Porto) ou Cláudia Lobato, do Instituto Superior Técnico. A nível internacional, estarão presentes, entre outros, especialistas em medicina regenerativa como Molly Stevens, do Imperial College de Londres, Jeffrey Karp, (Universidade de Harvard) ou investigadores ligados à indústria farmacêutica especialistas na utilização de células estaminais para identificação de fármacos.

Era uma vez dinossauro narigudo e cornudo numa ilha chamada Laramídia

Texto de Teresa Firmino publicado pelo jornal Público em 18/07/2013.
Não é um boi com um bico à papagaio, embora pareça. É a mais recente coqueluche dos paleontólogos que estudam dinossauros.
Ilustração científica do dinossauro Nasutoceratops
Há mais de 70 milhões de anos, no Cretácico Superior, o nível do mar tinha subido significativamente e muitas terras estavam submersas – a América do Norte não era excepção e o resultado foi o aparecimento de um mar interior de águas pouco profundas, estendendo-se desde o oceano Árctico até ao golfo do México e que dividiu o continente em duas massas de terra. Uma era a ilha Laramídia, onde habitava um “extraordinário dinossauro”, como refere o título do artigo científico que o descreve, por ter um nariz particularmente grande e uns cornos que mais pareciam os de um boi.
 
O lado invulgar do bicho está expresso no nome científico escolhido pela equipa de Scott Sampson, então conservador do Museu de História Natural do Utah e agora vice-presidente das colecções e investigação do Museu de Ciência e Natureza de Denver, nos Estados Unidos: Nasutoceratops quer dizer em latim “cara cornuda com nariz grande”. O nome completo, Nasutoceratops titusi, é ainda uma homenagem a Alan Titus, paleontólogo do Monumento Nacional Grand Staircase-Escalante, uma enorme zona desértica no estado do Utah onde o dinossauro foi encontrado.
 
O primeiro exemplar foi descoberto em 2006, por um estudante da Universidade do Utah, seguindo-se outros fósseis deste dinossauro, todos guardados no Museu de História Natural do Utah, em Salt Lake City, e que serviram de base ao artigo que descreve a nova espécie na revista britânica Proceedings of the Royal Society B.
 
Ela é a mais recente aquisição do grupo de dinossauros com cornos, ou ceratopsídeos, de que o Triceratops, com nove metros de comprimento e mais de cinco toneladas, é o representante mais famoso. Eram corpulentos, quadrúpedes, herbívoros e tinham um focinho em forma de bico de papagaio. A maioria das espécies tinha um grande crânio com um único corno no nariz e outros dois por cima dos olhos e um escudo ósseo na parte de trás da cabeça.
 
Em relação aos outros ceratopsídeos, o Nasutoceratops, além das particularidades do nariz e dos cornos longos e curvados para a frente, apresentava diferenças no escudo ósseo, menos ornamentado com espinhos. Tinha cinco metros de comprimento e atingia 2,5 toneladas.
 
Olfacto apurado?
Para que serviam os cornos e os escudos é uma questão para a qual a comunidade científica não tem resposta segura. Hipóteses não faltam, indo desde a defesa de predadores e do controlo da temperatura do corpo até ao reconhecimento de indivíduos da mesma espécie e à competição sexual. Esta última hipótese, a mais aceite pela comunidade científica, considera que os escudos e cornos tinham a função de intimidar os indivíduos do mesmo sexo e atrair os do sexo oposto, como acontece por exemplo com as caudas dos pavões e as antenas dos veados.
 
“É muito provável que os cornos extraordinários do Nasutoceratops fossem usados como sinais visuais de domínio e, quando isso não chegava, como armas para combater os rivais”, considera um dos cientistas da equipa, Mark Loewen, em comunicado da universidade do Utah.
 
“Provavelmente, o nariz de Jumbo de Nasutoceratops não tinha nada a ver com um cheiro apurado – uma vez que os receptores do olfacto estão mais para trás na cabeça, junto ao cérebro – e a função desta bizarra característica permanece incerta”, esclarece, por sua vez, Scott Sampson.
 
Voltemos à Laramídia: o Utah ocupa agora a parte sul dessa ilha de outrora, que era quase do tamanho da Austrália e onde o protagonista desta história vivia há 76 milhões de anos num ambiente pantanoso e quente, a cerca de 100 quilómetros da costa do Mar Interior Ocidental, que dividia o continente em duas massas de terra. A Laramídia, muito rica em fósseis de dinossauros, estava do lado oeste e a Apalachia a leste.
 
A equipa quer agora perceber o que levava umas espécies de dinossauros a habitar o Norte da Laramídia (Alberta, no Canadá, e Montana, nos Estados Unidos), enquanto outras se ficavam pelo Sul (nos estados norte-americanos do Novo México e do Texas, além do Utah). E como é que nessa ilha conviviam cerca de duas dezenas de espécies de dinossauros de tamanho considerável, enquanto actualmente em toda a África só existem cinco espécies de mamíferos gigantes, do tamanho de elefantes e rinocerontes, sublinha o comunicado.
 
“O Nasutoceratops”, conclui Eric Lund, outro investigador da equipa, “é um maravilhoso exemplo do quanto ainda temos para aprender sobre o mundo dos dinossauros”.

Cromossoma que causa a síndrome de Down foi desligado no laboratório

Texto de Nicolau Ferreira publicado pelo jornal Público em 17/07/2013.
Pela primeira vez, uma equipa de cientistas conseguiu silenciar um dos três cromossomas 21, que é responsável pela síndrome de Down. Este resultado poderá ajudar a desenvolver novos tratamentos.
As pessoas com trissomia 21 têm uma esperança de vida mais baixa
A espécie humana tem 46 cromossomas. Um desvio deste número mágico dá, na maior parte das vezes, mau resultado. A trissomia 21 é um desses exemplos. Quem nasce com síndrome de Down tem três cromossomas 21, em vez de dois, o que causa uma série de complicações fisiológicas e uma capacidade cognitiva limitada. Agora, pela primeira vez, uma equipa de cientistas conseguiu no laboratório desligar este cromossoma a mais em células de pessoas com trissomia 21. Os resultados são publicados nesta quarta-feira na edição online da revista Nature e prometem trazer uma nova compreensão sobre esta doença que pode resultar em terapias.
 
“Para as pessoas que vivem com a síndrome de Down, a nossa esperança é que a demonstração deste conceito abra vários caminhos para estudar este problema e torne possível pensar em investigar no futuro uma ‘terapia cromossómica’”, explica Jeanne Lawrence, da Escola Médica da Universidade do Massachusetts, nos EUA, que liderou este projecto.
 
É ainda uma realidade a muito longo prazo, que parece para já um cenário impossível. Só se consegue detectar que um feto tem um cromossoma 21 a mais a partir da 12ª semana de gestação. E qualquer terapia só é possível após o nascimento, quando muitos problemas já estão presentes. Por se conhecer tão pouco da doença, não se sabe hoje que efeitos teria um tratamento nessa altura.
 
Mas é talvez nisso que, para já, esta descoberta pode ajudar: compreender como é que um simples cromossoma 21 a mais nas células provoca problemas cognitivos, o início precoce da doença de Alzheimer, um aumento de risco de leucemia na infância, defeitos no coração, no sistema imunitário ou endócrino, que fazem diminuir a esperança de vida.
 
Em muitos casos, a causa da trissomia 21 começa antes da fecundação, quando se produzem as células sexuais que vão dar origem a um indivíduo com esta síndrome.
 
Os 46 cromossomas humanos são oriundos das células sexuais dos nossos pais que se juntam na fecundação. O ovócito tem 23 cromossomas — classificados desde o cromossoma um até ao 22, mais o cromossoma sexual feminino X. O espermatozóide carrega outros 23 cromossomas — que, além dos 22 cromossomas, inclui o cromossoma sexual X ou Y, que define se o embrião vai ser uma mulher (XX) ou um homem (XY).
 
No caso da trissomia 21, uma das células sexuais traz, em vez de um, dois cromossomas 21. Isto acontece durante a produção dos espermatozóides ou dos ovócitos. Quando ocorrem as divisões celulares para se produzirem estas células, os 46 cromossomas têm de passar equitativamente a metade, mas às vezes a separação não é bem feita e o espermatozóide ou o ovócito acabam por ficar com um cromossoma a mais.
 
A síndrome de Down é das trissomias mais comuns, um em cada 800 recém-nascidos tem-na, mas também existem trissomias dos cromossomas sexuais e dos cromossomas 13 e 18.
 
O cromossoma 21 é o mais pequeno dos 22 cromossomas não sexuais. O nosso genoma tem 20.000 genes que comandam o fabrico de proteínas diferentes, além de muitos mais genes que controlam a actividade ao nível do ADN e tornam possível que um ser humano se desenvolva a partir de uma célula. Estes genes estão distribuídos pelos vários cromossomas em longas sequências de ADN. O cromossoma 1 carrega 2073 genes que codificam proteínas, já o cromossoma 21 tem apenas 242 genes.
 
Por isso, no caso de pessoas com trissomia 21, as suas células estarão a produzir estas 242 proteínas em mais quantidade. De uma forma simplificada, a grande questão é saber quando é que o excesso de uma proteína A no tecido B está a provocar o problema C numa pessoa com síndrome de Down.
 
Jeanne Lawrence e colegas ainda estão um passo atrás da resolução desse problema. A equipa conseguiu fazer com que um dos três cromossomas 21 deixasse de activar os seus genes. Para tal, serviu-se de um fenómeno que já acontece nas células de todas as mulheres e imitou-o.
 
Ainda que as mulheres tenham dois cromossomas sexuais X, só precisam de um activo (nos homens, o cromossoma Y tem os genes que garantem o desenvolvimento dos seus órgãos sexuais). Nas mulheres, logo no início do desenvolvimento embrionário, um dos dois cromossomas X activa o gene XIST, produzindo uma molécula de ARN. É este ARN que prende este cromossoma X em vários locais como um cadeado, impedindo-o de funcionar. Assim, só um dos cromossomas X funciona quando o embrião se desenvolve.
 
A equipa serviu-se do gene XIST para fazer o mesmo em células de pessoas com síndrome de Down. Através de engenharia genética, reprogramaram essas células adultas, transformando-as em células estaminais. E inseriram aí o gene XIST num dos cromossomas 21. Quando o gene começou a funcionar, este cromossoma ficou silenciado, não activando os genes. Estas células passaram a ter uma actividade genética semelhante às células com 46 cromossomas.
 
De seguida, forçaram essas células estaminais a tornarem-se neurónios, para comparar o seu desenvolvimento quando tinham três cromossomas 21 ou quando um dos três cromossomas estava silenciado por este novo método. Os resultados mostraram que os neurónios com o cromossoma desligado multiplicavam-se mais e agrupavam-se de forma mais organizada. “Agora temos uma ferramenta poderosa para identificar e estudar as patologias e as vias celulares que estão a ser condicionadas pela sobre expressão do cromossoma 21”, explica Jeanne Lawrence.
 
Para João Pinho da Silva esta descoberta “é um avanço muito grande”, mas “ainda é cedo para se prever o que pode acontecer no organismo”, explica o médico geneticista do Instituto de Biologia Molecular e Celular do Porto. “Num bebé com trissomia 21, alguns dos problemas já estão instalados e não sabemos se uma terapia [que surja desta investigação] poderá reverter os sintomas ou impedir o seu avanço.”

E se o seu telemóvel fosse recarregável com urina?

Texto de Teresa Firmino publicado pelo jornal Público em 17/07/2013.
Electricidade gerada por bactérias que usam os químicos da urina no seu ciclo de vida normal já deu para enviar mensagens e até um breve telefonema. Em zonas remotas, inovação pode ser de grande importância.
O investigador Ioannis Ieropoulos mostra a sua invenção
Sim, é possível carregar telemóveis comerciais utilizando a própria urina: a tecnologia foi inventada por uma equipa de cientistas britânicos, que a revela na revista científica Physical Chemistry Chemical Physics. O segredo está no desenvolvimento de novas pilhas de combustível microbianas, que contêm bactérias capazes de transformar a matéria orgânica presente na urina em electricidade.
 
A equipa de Ioannis Ieropoulos, do Laboratório de Robótica de Bristol, uma parceria entre as universidades de Bristol e do Oeste de Inglaterra, criou pilhas de combustível que estão cheias de bactérias, como as que se encontram por exemplo nos sedimentos e nas nossas tripas. São essas bactérias que decompõem os químicos da urina durante os seus processos metabólicos normais. À medida que consomem a matéria orgânica na urina, as bactérias originam a produção de electrões, o que cria então uma carga eléctrica (ainda que pequena) que pode ser armazenada nestas pilhas de combustível.
 
“Essencialmente, a electricidade é um subproduto do ciclo de vida natural dos micróbios. Quanto mais comem coisas como urina, mais energia geram e por longos períodos de tempo”, refere a Universidade do Oeste de Inglaterra em comunicado. “A electricidade gerada é relativamente pouca e até agora só temos sido capazes de armazenar e acumular estes pequenos níveis de energia em condensadores ou supercondensadores, para curtos ciclos de carga e descarga. [Mas] é a primeira vez que fomos capazes de carregar directamente a bateria de um aparelho como um telemóvel, o que é de facto um avanço”, acrescenta-se no comunicado.
 
“Isto é uma estreia mundial. Ninguém tinha aproveitado energia da urina para fazer isto. Nada é mais ecológico do que usar um resíduo final como fonte de energia para produzir electricidade”, sublinha Ioannis Ieropoulos. “Até agora, a pilha de combustível microbiana que desenvolvemos gera energia suficiente para mensagens sms, navegação na Internet e uma breve chamada telefónica. A chamada num telemóvel consome a maior parte da energia, mas lá chegaremos ao dia em que poderemos carregar uma bateria por longos períodos. O conceito foi testado e funciona – e agora compete-nos refinar o processo, para desenvolvermos pilhas de combustível microbianas que carregam completamente uma bateria.”
 
Por ora, a inovação ainda é do tamanho da bateria de um carro, composta por uma cascata de pilhas de combustível microbianas, por onde entra e sai a urina. Mas a equipa pensa que conseguirá reduzir-lhe o tamanho para ser facilmente transportável. As pilhas de combustível que os cientistas usaram para carregar um telemóvel levam cerca de 50 mililitros de urina, segundo The Independent: “Mas a mais pequena com que trabalhámos no laboratório contém um mililitro, portanto conseguimos fazê-las muito mais pequenas. O objectivo é que possam transportar-se facilmente”, disse o investigador ao jornal britânico.
 
Em zonas remotas de países em desenvolvimento, pode dar muito jeito ter uma bateria destas para os telemóveis, razão porque a Fundação Bill e Melinda Gates, que apoia vários projectos nesses países, está entre os financiadores da inovação.
 
O sonho da equipa é que um dia as nossas casas de banho sejam locais onde se gere electricidade recorrendo à urina. As luzes, o secador de cabelo, a máquina de barbear, a escova dos dentes eléctrica e, claro, os telemóveis seriam todos alimentados desta maneira. Realidade ou futurismo a mais, o tempo o dirá.

Criados vasos sanguíneos em ratinhos que funcionaram durante meses

Texto de Nicolau Ferreira publicado pelo jornal Público em 17/07/2013.
Usando células humanas adultas que foram reprogramadas, uma equipa criou vasos sanguíneos de raiz.
Vasos sanguíneos (a verde-amarelado) no cérebro de ratinho criados com células humanas
A engenharia de tecidos teve um grande avanço quando em 2006 se conseguiu reprogramar células adultas forçando-as a ser células estaminais. A técnica foi agora utilizada para fabricar vasos sanguíneos, que conseguiram funcionar durante nove meses no cérebro de ratinhos. Os vasos formaram-se a partir de células humanas, o que é um passo em frente para a medicina regenerativa e para o tratamento de doenças cardiovasculares.
 
"Tivemos sucesso a fabricar vasos sanguíneos funcionais a partir de células endoteliais [que dão origem à parede interior dos vasos sanguíneos] e de células precursoras do mesênquima [tecido de suporte], que foram derivadas das mesmas células estaminais pluripotentes induzidas humanas de voluntários saudáveis e de doentes com diabetes do tipo 1" em ratinhos, explica ao PÚBLICO Rakesh Jain, cientista do Hospital Geral do Massachusetts, em Boston, que co-dirigiu o estudo publicado na última edição da revista norte-americana Proceedings of the National Academy of Sciences.
 
A produção destas células foi feita graças à reprogramação genética de células adultas. Deste modo, tem sido possível tornar células adultas, já diferenciadas num tecido, em células estaminais pluripotentes. Depois, consoante o tratamento que se dá a estas células estaminais pluripotentes induzidas (iPSC, na sigla em inglês), pode voltar-se a criar todo o tipo de tecidos. Assim, conseguiu-se contornar o problema do uso das células estaminais embrionárias, que levanta muitas questões éticas, e desenvolver um ramo de investigação que tem hoje uma enorme potencialidade para ser aplicado na medicina. Aliás, o Prémio Nobel da Medicina de 2012 foi dado a John B. Gurdon e Shinya Yamanaka pelo desenvolvimento desta técnica.
 
Agora, a equipa de Rakesh Jain e Dai Fukurama utilizou as iPSC humanas e desenvolveu precursores de células endoteliais que apresentavam uma assinatura específica conveniente para se organizarem em vasos sanguíneos. A estas células, os cientistas juntaram células que já se diferenciam em tecido de suporte, também proveniente de iPSC humanas, e colocaram tudo na camada externa do cérebro de ratinhos.
 
Em apenas duas semanas, as células organizaram-se e criaram vasos sanguíneos que transportaram sangue. Só ao fim de nove meses é que estes vasos deixaram de funcionar, mas nunca originaram teratomas, um tipo de tumor.
 
No cérebro e na pele
A equipa aplicou ainda o mesmo método na pele dos ratinhos. Aqui, também se verificou o crescimento de vasos sanguíneos, mas a equipa teve de utilizar cinco vezes mais células do que as aplicadas no cérebro dos ratinhos e os vasos sanguíneos só resistiram durante um mês. Rakesh Jain diz que o número de células de suporte nos vasos sanguíneos é muito menor na pele do que no cérebro, o que explicará o maior sucesso da experiência no cérebro.
 
As contingências de cada tecido mostram que no futuro será "importante fabricar células endoteliais específicas consoante o tipo de aplicação clínica", diz o cientista.
 
Os investigadores também conseguiram criar vasos sanguíneos a partir de iPSC humanas de doentes com diabetes 1. Estes doentes deixam de produzir insulina, uma enzima que ajuda a metabolizar o açúcar, o que pode provocar problemas vasculares como o entupimento das veias.
 
"Esta descoberta sugere que [esta técnica] tem a potencialidade de ser utilizada para tratar doenças vasculares usando a engenharia regenerativa baseada em células", escrevem os autores na conclusão do artigo. Outra possível aplicação é a produção de órgãos humanos.
 
Para já, a equipa quer repetir as experiências com células humanas de pessoas que tenham outras doenças vasculares. O objectivo é compreender as diferenças presentes nos mecanismos envolvidos na formação dos vasos sanguíneos.

Aquecimento global pode fazer subir nível do mar em 2,3 metros por cada grau Celsius

Artigo publicado pelo jornal Público em 17/07/2013
Cientistas acreditam que esta é a primeira "estimativa robusta" do impacto que pode ter o aumento da temperatura do planeta nos oceanos. É preciso adaptar as zonas costeiras, alertam.
Degelo na Gronelândia é um dos factores que faz subir o nível do mar
O nível do mar pode subir 2,3 metros por cada grau Celsius que aumentar a temperatura do planeta, e manter-se assim durante séculos. Esta é a conclusão de um estudo elaborado por um reputado instituto de investigação alemão, que analisa o impacto do aquecimento global no degelo dos glaciares e icebergues.
 
Anders Levermann, coordenador do trabalho elaborado no Instituto para a Investigação sobre o Impacto do Clima, em Potsdam, diz que esta é a primeira análise feita com base na história da evolução do clima, combinada com simulações em computador dos três factores que podem contribuir para a subida do nível do mar a longo prazo: a expansão termal (aumento de temperatura) dos oceanos, o recuo dos glaciares de montanha e o degelo das calotes glaciares da Gronelândia e da Antárctida.
 
"No passado, havia alguma incerteza e não se sabia quanto poderia ser [o aumento]", afirmou Levermann à Reuters. "O que estamos a dizer agora é que, tendo em conta tudo o que sabemos, temos uma estimativa robusta de 2,3 metros de subida do nível do mar por cada grau de aquecimento", explicou.
 
Nos últimos cem anos, o nível do mar subiu 17 centímetros, a uma média de três milímetros por ano, segundo o Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC) das Nações Unidas. Um terço deste aumento resulta do degelo na Antárctida e na Gronelândia.
 
Segundo o mesmo organismo, a temperatura média da superfície do planeta subiu cerca de 0,8 graus Celsius desde a Revolução Industrial (meados do século XVIII) e deverá aumentar entre 0,4 a 1 grau entre 2016 e 2035, em comparação com as temperaturas registadas no período de 1985 a 2005.
 
O IPCC considera que o aquecimento global é resultado da emissão de gases com efeito de estufa, provenientes da queima de combustíveis fósseis como o petróleo e o carvão. Alguns cientistas, no entanto, consideram que o aumento da temperatura global resulta das flutuações naturais do clima no planeta, não se devendo assim à acção humana.
 
Seja como for, cerca de 200 países concordaram em tomar medidas para limitar o aumento da temperatura para menos de dois graus Celsius acima da era pré-industrial. “A subida do nível do mar é algo que não podemos evitar, a menos que as temperaturas globais desçam novamente”, observou Anders Levermann, citado pela agência Reuters.
 
“Os nossos resultados indicam que é preciso uma maior adaptação das zonas costeiras. É provável que algumas regiões actualmente muito povoadas não possam ser protegidas no longo prazo”, admitiu.
 
Alguns estudos já tinham estimado a elevação do nível do mar para cerca de dois metros até 2100, o que provocaria o alagamento de algumas regiões – é o caso do Bangladesh e do estado americano da Florida, por exemplo.
 
“Acreditamos que a nossa estimativa é robusta por causa da combinação das leis da física com os dados que usamos”, sublinhou o coordenador do estudo. “Penso que estabelecemos um modelo de referência sobre quanto vai subir o nível do mar com os aumentos da temperatura.”