segunda-feira, 30 de novembro de 2015

O mito de Einstein



Um dos pontos altos deste Ano Internacional da Luz é a celebração precisamente hoje, dia 25 de Novembro, do centenário da obra maior de Albert Einstein, a teoria da relatividade geral, que descreve a força da gravidade, ultrapassando Newton. Foi um dos maiores empreendimentos do espírito humano: percebeu-se que conceitos aparentemente tão díspares como o espaço, o tempo, a matéria e a energia estavam ligados por uma equação matemática que culminava longos esforços em demanda de uma descrição unificada do Universo. Ainda hoje essa equação se mantém de pé, apesar de todas as investidas teóricas e experimentais para a derrubar. De facto, a Natureza nada revelou até agora que nos faça duvidar da solidez da descrição einsteiniana.

Para mim como para tantos outros que escolherem a Física como profissão, Einstein foi um herói da juventude. Não me sentia tanto seduzido pelo lado icónico, seguramente o mais visível: o sábio de ar bondoso, farta cabeleira, camisola de lã e sandálias. Tratava-se antes da atracção pelo invisível, que a sua figura personificava melhor do que qualquer outra. Ele encarna a ideia de que o mundo é compreensível. Não sabemos porquê, mas é. O físico Einstein foi um pouco filósofo ao declarar: “O que há de mais incompreensível no mundo é o facto de ele ser compreensível.” Pode ser difícil, mas é possível decifrar os mistérios do mundo. O sábio suíço, nascido na Alemanha, também disse um dia que: “Deus é subtil, mas não é malicioso”. Não sendo ele uma pessoa religiosa no sentido comum, queria ele dizer que o Universo é intrincado, mas os seus mecanismos são acessíveis à mente humana. O trabalho continuado dos físicos e dos outros cientistas tem confirmado essa afirmação.

Incompreensível é também o facto de o mundo se revelar compreensível através de equações. O cérebro de Einstein produziu há cem anos uma equação, cuja beleza espantou o próprio autor (“A teoria é de uma beleza incomparável”, comentou), que permitiu previsões que se haveriam de revelar certeiras a respeito do mundo: um minúsculo desvio da órbita de Mercúrio em relação ao previsto usando as leis de Newton; uma pequena deflexão pelo Sol da luz proveniente de estrelas por detrás dele; buracos negros, abismos cósmicos que são fins locais do espaço-tempo; e o Big Bang, que é o início global do espaço-tempo a partir de uma prodigiosa concentração de energia. Galileu tinha dito que “o Livro da Natureza está escrito em caracteres matemáticos”. E Newton tinha escrito os Princípios Matemáticos de Filosofia Natural, contendo a sua lei da gravitação universal. Mas Einstein veio acrescentar, numa base matemática, que a geometria do espaço-tempo (espaço e tempo tinham sido ligados em 1905 na sua teoria da relatividade restrita) é comandada pela matéria-energia (os dois também ligados na mesma altura). A força da gravidade mais não é do que o encurvamento do espaço-tempo, às ordens da matéria-energia. Para usar uma metáfora visual, um astro como o Sol está no espaço-tempo como uma bola em cima de um lençol esticado. Se colocarmos um berlinde, que será a Terra, com velocidade adequada ele rodará em torno da bola central.

Roland Barthes, o semiólogo e filósofo francês que tal, como a teoria maior de Einstein, nasceu há cem anos (designadanmente a 12 de Novembro de 1915), escreveu nas suas Mitologias (Edições 70, 1978): “(...) o produto da sua invenção assumia uma condição mágica, reincarnava a velha imagem esotérica e uma ciência inteiramente encerrada nalgumas letras. Há um único segredo do mundo e esse segredo condensa-se numa palavra, o Universo é um cofre-forte de que a humanidade procura a cifra: Einstein chegou quase a encontrá-la, é esse o mito de Einstein; aí se nos deparam de novo todos os temas gnósticos: a unidade da Natureza, a possibilidade irreal de uma redução fundamental do mundo, o poder de abertura da palavra, a luta ancestral entre um segredo e uma linguagem, a ideia de que o saber total não pode descobrir-se senão de um só golpe, como uma fechadura que cede bruscamente depois de mil tacteamentos infrutuosos.”

O prolongado confronto do cérebro humano com o Universo (um confronto natural pois o nosso cérebro é a única parte do Universo que o consegue compreender) vai tendo resultados felizes, como a epifania de Einstein há cem anos. A história da ciência ensina-nos que cada revelação não é o fim de nada, mas um novo princípio. Einstein não foi o fim de Newton, cuja teoria da gravitação universal continua a ser válida em certas condições. Foi o início de uma cosmovisão bem mais fantástica do que a de Newton, pois o mundo do sábio inglês não podia albergar buracos negros nem provir de uma explosão inicial. Escreveu o Padre Teilhard de Chardin, paleontólogo e teólogo francês contemporâneo de Einstein: “à escala do cósmico só o fantástico pode ser verdadeiro.”
Professor Universitário (tcarlos@uc.pt)

De onde vêm as principais leveduras do vinho? Dos carvalhos do Mediterrâneo


Equipa coordenada por investigador português acaba de descobrir a origem selvagem das leveduras vínicas mais utilizadas na fermentação das uvas. Este é um novo capítulo da história da domesticação do nosso melhor “microamigo”.

Amostras da levedura Saccharomyces cerevisiae
Frascos com pedaços de carvalho recolhidos no campo para obter amostras de leveduras
A vinha e o vinho são tradicionais no Mediterrâneo
Ao longo da história, o homem tem domesticado animais, plantas e até microrganismos, através da selecção e propagação de características consideradas úteis ou interessantes. Foi o que aconteceu também com a levedura do vinho. Actualmente, as leveduras que existem nas uvas, nas vinhas, nos lagares e nas adegas — e que são responsáveis pela fermentação da uva para produzir vinho — são muito semelhantes em todo o mundo: pertencem a uma população global da espécie Saccharomyces cerevisiae. Até agora, não se sabia de onde vinham estas leveduras. Mas a equipa de José Paulo Sampaio, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-UNL), descobriu o “parente selvagem” das principais leveduras do vinho: vive nas cascas de carvalhos da região mediterrânica.

As leveduras vínicas pertencem a um grande grupo de leveduras de cuja ecologia pouco se sabe, embora sejam muito estudadas em laboratório e com aplicações industriais. “Pasteur foi o primeiro a estudar [as leveduras do género] Saccharomyces e muitos outros lhe seguiram as pisadas. No entanto, apesar de receber tanta atenção desde os primórdios da microbiologia, ainda hoje ninguém sabe com exactidão como e onde vivem na natureza”, conta o biólogo José Paulo Sampaio.

No caso da levedura Saccharomyces cerevisiae, ela acompanha o homem há milhares de anos e é utilizada não só para a produção de vinho — há estirpes com características diferentes usadas para levedar a massa de pão e para produzir algumas cervejas e bioetanol.

Os novos resultados da equipa do investigador português foram publicados na Molecular Ecology e esta revista decidiu convidar especialistas nesta área a escrever um comentário sobre o trabalho para ser publicado em simultâneo. “Para conhecer a origem das leveduras do vinho, precisávamos de conhecer o seu parente mais próximo em condições naturais — e foi isto que este trabalho identificou”, sublinha ao PÚBLICO Christian Landry, da Universidade de Laval, no Canadá, um dos três autores do comentário. Para estes especialistas, os novos resultados científicos esclarecem o processo de domesticação “do melhor microamigo do homem”.

“Agora podemos perceber se as leveduras do vinho foram domesticadas uma ou mais vezes ao longo da história da humanidade. Permite-nos também perceber de onde vêm os genes destas leveduras que as tornam boas produtoras de vinho”, acrescenta o investigador canadiano. “A longo prazo, este estudo ajudar-nos-á a compreender a história da produção de vinho e poderá também ser útil para os produtores de vinho que se interessem em saber por que é que algumas estirpes são melhores do que outras na produção de vinho.”

O vinho é produzido através da fermentação das uvas (esmagadas) por acção das leveduras, que transformam o açúcar da fruta em álcool e dióxido de carbono. Embora a Saccharomyces cerevisiae não seja a única levedura envolvida na produção de vinho, é a mais importante. “No mosto inicial, há uma multidão de leveduras. No processo de produção do vinho, ocorre naturalmente uma sucessão de microrganismos, acabando por predominar a levedura Saccharomyces cerevisiae”, explica José Paulo Sampaio.

O processo industrial é muito semelhante, mas neste caso há a intervenção do próprio produtor de vinho — “são adicionadas leveduras seleccionadas, para que estas predominem”.

José Paulo Sampaio dedica-se ao estudo da evolução e diversidade de leveduras desde o seu doutoramento, na década de 1990, e este é o tema principal de investigação do grupo que lidera na Unidade de Ciências Biomoleculares Aplicadas na FCT-UNL. “A [nossa] investigação consiste em compreender as transformações que estão por detrás da domesticação microbiana, ou seja, as modificações genéticas que deram origem às leveduras que hoje utilizamos para produzir produtos como o vinho”, explica. “Estes assuntos têm interesse académico, porque se relacionam com a evolução. E têm interesse aplicado, porque a compreensão destes fenómenos ajuda-nos a melhorar e a diversificar os produtos industriais.”

Este grupo de investigação tem estudado a origem das leveduras responsáveis pela fermentação na produção de cerveja e cidra, além dos vinhos, recolhendo amostras destes microrganismo por todo o mundo. “Já viajei pela Patagónia argentina, pelo Cerrado brasileiro, regiões montanhosas na Nova Zelândia e florestas na Austrália e Nova Caledónia. E encontrámos leveduras selvagens da Saccharomyces que nunca ninguém tinha encontrado”, relata o cientista.

Indiana Jones da microbiologia
O projecto de investigação que esteve na base do artigo na Molecular Ecology iniciou-se em 2005, com a procura de populações selvagens de Saccharomyces cerevisiae em árvores em Portugal. E foi nas cascas de carvalhos que os cientistas as descobriram.

Mais tarde, estenderam o trabalho a ambientes naturais por outras regiões do globo — Espanha, França, Itália, Eslovénia, Grécia e Japão —, escolhendo locais de amostragem representativos da diversidade das regiões e em colaboração com cientistas de outros países. Por todo o mundo, recolheram muitas amostras em espécies de carvalhos e de outras árvores.

“O trabalho de campo tem um pouco de Indiana Jones da microbiologia. Mas é sobretudo cansativo e repetitivo. Há calor, moscas e pó”, considera José Paulo Sampaio. “Em cada saída recolhemos dezenas ou centenas de amostras de casca ou de solo debaixo da árvore. E anotamos a localização de cada colheita. As amostras são colhidas assepticamente e colocadas em sacos estéreis. A parte laboratorial começa quando colocamos as amostras em frasquinhos”, descreve ainda.

Entre as amostras de leveduras recolhidas, a equipa sequenciou o genoma de 90 delas. A comparação dos genomas dessas 90 amostras e de outras amostras de todo o mundo disponíveis em bancos de dados revelou a identidade dos parentes selvagens mais próximos das leveduras do vinho: são leveduras que existem em cascas de carvalho na bacia mediterrânica. E foi na Península Ibérica, no Sul de França, em Itália, na Grécia e Eslovénia que as encontraram.

A surpresa não foi tanto pela descoberta das leveduras selvagens no Mediterrâneo — afinal, essa é a região de origem da vinha e do vinho —, mas por ter sido nas cascas de carvalhos. Mais exactamente, encontraram-nas no carvalho-português (Quercus faginea), no carvalho-negral (Quercus pyrenaica), na azinheira (Quercus ilex) e no carvalho-alvarinho (Quercus robur). Porém, no sobreiro (Quercus suber), que é uma das espécies de carvalhos mais frequente em Portugal, não se detectaram estas leveduras.

“Parece um paradoxo termos encontrado esta levedura em carvalhos, e não onde há muita fruta. Mas, embora existam centenas de espécies de carvalho, apenas a encontrámos em espécies de carvalho que têm cascas onde há vestígios de açúcar”, refere o investigador. “As bebidas alcoólicas surgem em todas as civilizações e têm uma história muito antiga: os registos mais antigos são da China sobre a fermentação do arroz. O vinho teve origem na bacia mediterrânica e disseminou-se a partir daí. Por isso, não ficámos muito surpreendidos por termos encontrado a população selvagem aqui.”

As análises genéticas mostraram que as leveduras das cascas de carvalho são da mesma espécie do que as leveduras vínicas — a Saccharomyces cerevisiae —, mas já pertencem a populações diferentes. A separação entre elas terá ocorrido entre há 1300 e 10.300 anos. O que, de acordo com o artigo, é coincidente com os primeiros registos de produção de vinho, que remontam a 5400 a 5000 anos a.C. Ou seja, esses registos têm 7400 a 7000 anos e são relativos a vestígios químicos da presença de vinho num recipiente encontrado numa aldeia do Neolítico na região do Irão.

A análise dos genomas das leveduras trouxe outras novidades. A levedura vínica tem genes importantes para a fermentação e produção de vinho, uma vez que contêm as instruções de fabrico de moléculas que transportam açúcares e compostos azotados para dentro das células. Mas a equipa descobriu que esses genes não existem nas leveduras Saccharomyces selvagens. Em contrapartida, há leveduras de outros géneros — como a Zygossacharomyces — que têm estes genes relevantes para a fermentação.

Portanto, esses genes na estirpe domesticada da Saccharomyces cerevisiae não vieram das suas congéneres selvagens e foram assim adquiridos de outras leveduras, ao longo de milénios de selecção para a produção de vinho. O facto de não existirem nas leveduras selvagens significa que a aquisição desses genes pela levedura do vinho ocorreu após a sua separação das populações selvagens. Ainda não se sabe como é que tal aconteceu: uma possibilidade é ter sido através de cruzamentos com outras leveduras e, como estes genes tinham efeitos favoráveis para a produção de vinho, foram seleccionados e propagados.

“Fomos nós que forçámos a aquisição destas características — esta é uma característica da domesticação”, remata José Paulo Sampaio. “Acho muito engraçado começar a transpor o conhecimento da domesticação para os micróbios”, considera o investigador, sublinhando que as espécies domesticadas, sejam animais, plantas ou micróbios, têm características relevantes para o homem que não existem nos parentes selvagens. “As espécies domesticadas estão associadas a um ambiente criado pelo homem — a levedura do vinho existe nas vinhas, nos lagares e nas adegas, onde ficam todo o ano de modo dormente”, acrescenta.

“Este trabalho representa um esforço gigantesco e inclui muitas componentes: recolha de amostras no campo, trabalho laboratorial de cultura e identificação dos microrganismos, sequenciação genética e a análise bioinformática”, frisa João Paulo Sampaio, referindo-se à importância das colaborações com investigadores de Itália, França, Reino Unido, Eslovénia e Japão para o sucesso deste projecto. “Algumas etapas demoraram mais de seis anos. É um trabalho quase fora de moda nos dias que correm.”

Os resultados estão já disponíveis para investigadores no mundo inteiro: as sequências de ADN das amostras de leveduras recolhidas pela equipa estão em bancos públicos de dados (como o GenBank) e as leveduras selvagens encontram-se guardadas na FCT-UNL, numa colecção destinada a investigação científica.
Texto editado por Teresa Firmino

Borracha escolar resolveu mistério dos pergaminhos medievais


O velino ultrafino das bíblias medievais terá sido feito com a pele de animais abortados? A resposta foi agora obtida utilizando uma técnica muito simples e não invasiva.

Extracção de proteínas de um pergaminho utilizando um pedaço de borracha
Sarah Fiddyment mostra o pergaminho de um acto jurídico
Página de uma bíblia do século XIII
Uma simples borracha em PVC permitiu a uma equipa internacional de biólogos, arqueólogos, medievalistas e outros especialistas concluir que o finíssimo pergaminho de que foram feitas, na Idade Média, as páginas das primeiras “bíblias de bolso”, afinal não provém, como especulavam alguns, da pele de fetos de animais. Os resultados foram publicados na última edição da revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS).

Milhares de bíblias de bolso foram fabricados, a partir do século XIII, sobretudo em França, mas também em Inglaterra, Itália e Espanha, lê-se num comunicado a Universidade de Iorque (Reino Unido), onde o estudo foi realizado. Alexander Devine, co-autor do estudo, e estudioso de manuscritos antigos, explica no mesmo documento que a importância e a influência das bíblias produzidas em grande escala ao longo do século XIII foram “o resultado directo do seu formato em volume único e portável, tornado possível pela combinação inovadora de estratégias de miniaturização e de compressão conseguidas através do uso de pergaminho extremamente fino”.

Como salientava, por outro lado e com alguma ironia, um outro co-autor do estudo – Bruce Holsinger, medievalista da Universidade da Virgínia (EUA) – num artigo da sua autoria publicado na mesma semana na revista The New York Review of Books, o facto é que “uma grande parte da nossa herança escrita sobrevive sob a forma de uma grande massa de restos mortais de animais”.

E este especialista fazia notar ainda que, no Reino Unido, continua a ser é obrigatório “imprimir e conservar as cópias oficiais das leis aprovadas pelo Parlamento em pele de animal, o que inspira ocasionalmente debates em Westminster acerca da ética e da economia do comércio de pergaminho” – tradição essa que poderá vir a acabar em breve, “para a grande consternação da comunidade dos conservadores [de arquivos] e dos especialistas de livros de arte”.

Velino uterino?
Seja como for, a utilização da palavra em latim abortivum em muitas fontes documentais para se referir ao pergaminho ultrafino desses volumes antigos levou alguns especialistas a sugerir que se tratava de “velino uterino” – isto é, que a pele de fetos de bovino, ovino e de outros animais de criação fora usada para o fabricar.

Pelo seu lado, os críticos desta teoria retorquiam que não teria sido sustentável criar animais apenas para abortar fetos com vista a produzir as grandes quantidades de velino necessárias para as edições em grande escala daquela altura. Ainda outra teoria estipulava que, para fabricar o pergaminho, também teriam sido utilizados animais selvagens como coelhos ou esquilos. Por último, havia quem propusesse que era possível obter o velino a partir da pele de animais mais velhos através de uma técnica específica de produção, hoje esquecida. E parece ser esta a teoria que agora se confirma a partir do estudo.

O trabalho foi realizado por cientistas do Reino Unido, França, Bélgica, Dinamarca, Irlanda e Estados Unidos, liderados por Sarah Fiddyment e Matthew Collins, do Departamento de Arqueologia da Universidade de Iorque. Os cientistas aplicaram pela primeira vez uma técnica não invasiva, dita de “extracção triboeléctrica de proteínas”, para resolver esta controvérsia de longa data. O método não podia ser mais simples e imediato: consiste em esfregar suavemente o pergaminho com uma borracha de PVC.

Na área da conservação, explicam os autores na PNAS, é corrente utilizar-se borrachas de PVC, semelhantes às borrachas da escola, para limpar os documentos antigos. Ora, como fazem ainda notar, o método apresenta uma vantagem adicional: proteínas provenientes do material antigo ficam agarradas à borracha ao mesmo tempo que a sujidade – e podem portanto ser analisadas para determinar a sua origem. Já agora, é graças à electricidade electroestática criada pela fricção (o chamado efeito triboeléctrico) que a borracha consegue “apagar” a sujidade e extrair as proteínas.

Os cientistas recolheram desta forma proteínas animais no velino de 72 bíblias de bolso medievais originárias de França, Inglaterra e Itália – e ainda, de 293 amostras de pergaminho do século XIII, lê-se no comunicado. A espessura dos pergaminhos variava de 0,03 a 0,28 milímetros.

Quando a seguir submeteram o material recolhido à clássica técnica de espectroscopia de massa, os cientistas conseguiram determinar, em particular, quais as espécies animais que tinham sido utilizadas para fabricar o velino. Uma primeira conclusão: “Não encontrámos qualquer vestígio de animais imprevistos”, diz Sarah Fiddyment, citada no mesmo documento. “Porém, conseguimos identificar mais do que uma espécie de mamífero num mesmo documento, e isso bate certo com a disponibilidade das peles conforme o local de fabrico.”

Quanto ao facto de poder tratar-se de pele de animais abortados, nada indica que esse seja o caso: “Os nossos resultados sugerem que o velino ultrafino não provém necessariamente do uso de animais abortados ou recém-nascidos com uma pele ultrafina, mas podem [pelo contrário] reflectir a utilização de um processo de produção que permitia transformar em velino de igual qualidade e finura a pele de mamíferos em maturação de diversas espécies”, acrescenta a investigadora.

A prova disso é o facto que, depois de concluído este trabalho, o co-autor e especialista em conservação de pergaminhos Jirí Vnoucek conseguiu recriar pergaminhos semelhantes ao “velino uterino" a partir de peles antigas. “É mais uma questão de utilizar a tecnologia certa de fabrico do que de recorrer à pele de animais uterinos”, explica. “Claro que as peles de animais mais novos são as melhores para produzir pergaminho fino, mas posso imaginar que toda a pele era utilizada e que nada era deitado fora.”

Uma das luas de Marte vai esmigalhar-se e dar um anel ao planeta


A lua Fobos tem como futuro a desintegração devido às forças gravitacionais a que está submetida. Mas não será para já. E das rochas e poeiras resultantes dessa destruição nascerá um novo acompanhante do planeta. 

Representação artística do futuro anel de Marte

Fobos, uma das duas luas de Marte
Marte tem duas luas, Fobos e Deimos. E a maior, Fobos, está a aproximar-se lentamente de Marte. Até agora não se sabia se isso a levaria à sua desintegração ou à colisão com o planeta. Dois investigadores da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos, prevêem que dentro de 20 a 40 milhões de anos a lua Fobos se despedaçará e os seus fragmentos vão dar origem a um anel. Assim, num futuro longínquo, o planeta vermelho terá como companheiros uma lua e um anel.

Este trabalho contribui para compreender a história dos satélites naturais e dos anéis dos planetas do nosso sistema solar. Tushar Mittal, um dos autores do estudo, explica, segundo um comunicado da sua universidade, que é provável que existissem muitas mais luas em redor dos planetas do sistema solar e que elas se tenham desintegrado e formado anéis. Pensa-se mesmo que esta seja a origem dos anéis dos planetas exteriores. Há anéis em redor de Júpiter e Saturno, os chamados “gigantes gasosos”, e de Urano e Neptuno, os “gigantes gelados”.

As duas luas de Marte — Fobos e Deimos, que significa “medo” e “pavor” em grego antigo — receberam o nome dos filhos do deus grego da guerra, Ares, a que os romanos chamaram Marte. Ambas as luas foram descobertas em 1877 pelo astrónomo norte-americano Asaph Hall. Pequenas, de forma irregular, fazendo lembrar batatas, pensa-se que as luas marcianas terão sido asteróides capturados pelo campo gravitacional de Marte. Deimos tem 18 quilómetros de diâmetro máximo e dez de mínimo. Já Fobos, a maior, tem 26 quilómetros de diâmetro máximo e 16 de mínimo, e encontra-se numa órbita mais próxima de Marte.

“Ao contrário da nossa Lua, que se afasta da Terra alguns centímetros por ano, Fobos está a aproximar-se de Marte alguns centímetros por ano. Por isso, é inevitável que colida ou se desintegre”, refere Benjamim Black, co-autor do estudo publicado na última edição da revista Nature Geoscience. “Uma das nossas motivações para estudar Fobos é que nos permite desenvolver ideias sobre os processos sofridos por uma lua à medida que se move em direcção a um planeta.”

Actualmente, só se conhece mais uma outra lua do sistema solar que se está a aproximar do seu planeta — Tritão, em órbita de Neptuno. No caso de Fobos, à medida que se aproxima de Marte, aumentam as tensões gravíticas a que está sujeito. A atracção exercida pela gravidade de um corpo maior provoca “forças de maré” num corpo mais pequeno, fazendo com que se estique e encolha. As forças de maré são as mesmas forças que provocam as marés na Terra e resultam, neste caso, da força da Lua e do Sol sobre a massa oceânica. Quando um corpo é sólido, como Fobos, estas forças causam tensões que resultam em fracturas.

Para deduzir o desfecho desta aproximação, a equipa estimou a coesão dos materiais de Fobos, baseando-se em dados geológicos e usando modelos geotécnicos.

Nesses cálculos da coesão, fizeram-se também simulações sobre a formação da maior cratera de impacto existente na lua — a cratera Stickney. Em 1973, a União Astronómica Internacional baptizou-a com o apelido de solteira da mulher de Asaph Hall, Angeline Stickney, que o tinha incentivado na procura de satélites de Marte. O impacto de um meteorito terá formado esta grande cratera de nove quilómetros de diâmetro, sem no entanto ter destruído a lua. Ora esta colisão é também um indicador da coesão de Fobos, uma vez que a lua se teria desintegrado se fosse ou muito rígida ou pouco.

A coesão da maior lua marciana é relativamente baixa, indicam os resultados do estudo. “Fobos é um agregado poroso e heterogéneo de rochas muito destruídas e outras mais intactas”, refere o artigo. A coesão do satélite será assim insuficiente para resistir às tensões gravíticas, que aumentam com a aproximação a Marte, o que causará a sua desintegração. Esta fragmentação será semelhante à que poderíamos observar se puxássemos uma barra de cereais pelas extremidades, espalhando migalhas e pedaços por todo o lado, descreve a equipa no comunicado.

As rochas e as poeiras resultantes da desintegração da lua continuarão a orbitar Marte e distribuir-se-ão rapidamente em volta do planeta, formando um anel. Se neste processo se formarem fragmentos muito coesos, eles continuarão a aproximar-se de Marte, acabando por colidir com o planeta, originando então mais crateras de impacto na sua superfície.

Mas estes acontecimentos não são para já. O anel só aparecerá dentro de 20 a 40 milhões de anos. A sua posterior evolução foi também prevista pelos cientistas. “O anel poderá persistir durante um a 100 milhões de anos, conforme a distância entre Fobos e Marte no momento em que a lua se desintegrar”, precisa Benjamim Black à agência noticiosa AFP.

O anel ficará em torno de Marte até os seus fragmentos caírem em Marte, como uma chuva de estrelas.

Quando pensamos em planetas com anéis, surge logo Saturno enfeitado pelos seus anéis gelados, que podemos ver da Terra com telescópios. Já o futuro anel de Marte, talvez nem se consiga ver da Terra (quem quer que cá estiver nessa altura), porque as poeiras não reflectem muita luz solar, ao contrário do gelo nos anéis de Saturno. “Mas, daqui a umas dezenas de milhões de anos, a visão a partir de Marte será espectacular”, antevê Benjamim Black.
Texto editado por Teresa Firmino

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Pode a atmosfera da Terra também desaparecer?

Sapo, Quero Saber
O anúncio que a NASA ia apresentar novidades sobre Marte criou expetativa; todos queriam saber: o que será que tinha acontecido à atmosfera do planeta vermelho? Agora que já sabemos que, afinal, foram as tempestades e ventos solares que "roubaram" a atmosfera do planeta, outra questão surge: será que pode acontecer à Terra?
 
Comecemos pelo início: a NASA acredita que, há cerca de quatro mil milhões de anos, Marte era tão habitável como a Terra é hoje. Prova disso são os vestígios de oceanos e lagos que, segundo os seus estudos, já existiram no planeta. Para isso, a sua atmosfera tinha de ser densa e quente - ao contrário do que é hoje, em que a atmosfera tem apenas 0,6% da pressão atmosférica à superfície da Terra, e o planeta tornou-se frio e árido.
 
Para perceber o que pode então ter acontecido, foi enviada a sonda MAVEN para estudar a sua atmosfera. Em março deste ano, durante uma violenta tempestade solar, a sonda detetou que a atmosfera do planeta vermelho perdeu mais partículas do que em condições normais. Esta conclusão levou à realização de quatro estudos publicados na Science and Geophysical Research Letters.
Uma representação de ventos solares a chegar até Marte.
A teoria é que, quando o Sol era ainda jovem e mais ativo, fortes tempestades solares fizeram com que o campo magnético de Marte enfraquecesse. Durante as tempestades, o Sol liberta grande quantidade de protões a elevadas velocidades. Quando se aproximam de Marte, geram um campo elétrico que atrai iões, que se libertam e tornam ainda mais fina a atmosfera.
Como os ventos solares chegam a Marte.
E Marte tornou-se o que hoje conhecemos. Mas poderá acontecer o mesmo à Terra?
A representação da perda de iões.
"A resposta é sobretudo sim" diz David Brain, que faz parte da missão MAVEN. "A Terra está a perder partículas, mas tem um grande escudo magnético", que afunila o campo elétrico das tempestades solares.
As zonas em que Marte perde mais iões.
A perda testemunhada atualmente na Terra é a um ritmo muito mais pequeno do que aconteceu em Marte. A repetir-se o fenómeno, vai demorar muito, mas muito tempo até que o nosso planeta também perca a sua atmosfera.
Imagens: NASA.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Há 300 milhões de anos já existiam animais que regeneravam membros


Fóssil do anfíbio Sclerocephalus que pertence ao grupo dos Temnospondyli estudado neste trabalho
Uma descoberta vem agora dar uma reviravolta a este tema. Uma equipa de cientistas identificou a regeneração de membros em fósseis de animais com quase 300 milhões de anos, segundo um estudo foi publicado na revista Nature. Para os cientistas, poderá restar um vestígio deste mecanismo molecular de regeneração no ADN de todos os tetrápodes, o grupo de animais onde estão os anfíbios, répteis, aves e mamíferos.
 
Os humanos conseguem reconstruir o fígado se ele for parcialmente destruído. Para isso, há multiplicação das células e uma organização precisa dos vários tecidos que compõem aquele órgão. É uma obra complexa. Mesmo assim, o novo fígado não recupera a antiga forma. Algo que é fulcral na regeneração de um membro: um braço depende da sua forma para ser um braço. E, uma vez perdidos, um braço ou uma perna ficam perdidos para sempre.
 
Mas a natureza está aí para mostrar alternativas. As lagartixas – os répteis que poderão ter inspirado o vilão lagarto – perdem facilmente a cauda quando são apanhadas por um predador. E volta a crescer não uma cauda mas uma pseudo-cauda: continua a cumprir uma função de equilíbrio, mas a arquitectura interna é diferente, pois, em vez de haver uma coluna vertebral, forma-se cartilagem.
 
A verdadeira capacidade de regeneração cabe às salamandras e aos tritões: os únicos tetrápodes que voltam a reconstruir uma cauda ou uma pata com todos os tecidos internos. Estes animais pertencem à família Salamandridae e não são répteis, são anfíbios, como os sapos e as rãs (no fundo, o vilão lagarto deveria ser afinal um maléfico tritão). Como mais nenhum tetrápode vivo tem esta capacidade, a visão clássica da biologia defendia que esta característica tinha surgido apenas na evolução dos “Salamandridae”.
 
O novo trabalho publicado na Nature contradiz esta perspectiva. A equipa de investigadores do Instituto para a Evolução e para a Ciência da Biodiversidade de Leibniz, na Alemanha, foi estudar fósseis de tetrápodes que viveram há cerca de 300 milhões de anos, 80 milhões de anos antes de as salamandras surgirem no registo fóssil.
 
“Os fósseis usados no nosso estudo representam membros de diferentes grupos de anfíbios da era Paleozóica”, diz ao PÚBLICO Nadia Fröbisch, uma das autoras do trabalho. A equipa estudou espécies de Temnospondyli, entre as quais está um antepassado antigo das salamandras, e espécies de Lepospondyli, um grupo que está mais próximo dos amniotas – os tetrápodes completamente terrestres, que deram origem aos répteis, aos mamíferos e às aves.
 
Olhando para aqueles fósseis, a equipa encontrou características semelhantes às que se encontram nos membros regenerados das salamandras e dos tritões. “Quando [nas salamandras] o membro foi muito dilacerado ou a cicatrização da ferida não correu bem, o membro regenerado mostra uma combinação de patologias que é muito característica. Encontrámos este tipo de patologias num dos Temnospondyli”, explica Nadia Fröbisch.
 
Por outro lado, nas espécies de Lepospondyli estudadas, os cientistas notaram marcas de regeneração ao compararem a pata traseira esquerda com a pata traseira direita. “Num dos lados, os ossos dos membros estão bem diferenciados e ossificados de acordo com o estádio de desenvolvimento de todo o fóssil, mas do outro lado só os ossos da perna junto ao tronco estão bem desenvolvidos, enquanto os ossos mais distantes se encontram mais imaturos, indicando que estão em regeneração”, acrescenta a cientista.
 
Para Nadia Fröbisch, esta descoberta é importante para situar a característica dos Salamandridae na história evolutiva dos vertebrados. “A regeneração não é específica das salamandras, estava disseminada no passado evolutivo. Isto pode influenciar os estudos para descobrir os mecanismos moleculares que controlam a regeneração das salamandras, já que esta descoberta indica que estes factores não são específicos delas. Existiam mecanismos moleculares presentes nos tetrápodes envolvidos na regeneração que ainda podem estar presentes em tetrápodes vivos, incluindo nos humanos”, defende a cientista, acrescentando que este conhecimento pode vir a ser usado “para desenvolver possíveis tratamentos e aplicações futuras na medicina humana”.
 
Seguindo a lógica da Marvel, podemos imaginar que, no futuro, a história do doutor Connors teria um final feliz: em vez de ter de recorrer ao ADN de outro animal, transformando-se num monstro, poderia reutilizar o seu próprio ADN de outra maneira para fazer regenerar o seu braço, mantendo-se humano.
 
Mas voltando à evolução e às dúvidas dos cientistas, não se sabe por que é que a grande maioria dos tetrápodes deixou de ter esta capacidade aparentemente tão vantajosa. “Parece contra-intuitivo”, diz-nos a cientista. O custo energético alto ou a incompatibilidade com outras características importantes podem explicar a sua perda, considera. “As salamandras são especiais em muitos aspectos, como o seu metabolismo ou o facto de terem as maiores células entre os vertebrados vivos”, acrescenta Nadia Fröbisch. “Se calhar a capacidade regenerativa nunca foi seleccionada negativamente nas salamandras e por isso ainda está presente.”

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Conflitos no Iraque e Síria reduzem drasticamente níveis de poluição

Green Savers  28/10/2015
A guerra, catástrofes humanitárias e crise económica na Síria (na imagem), Iraque, Palestina e Egipto está a originar uma redução drástica dos níveis de poluição nestes locais – entre 20 a 50% desde 2010, de acordo com investigadores citados pelo jornal Guardian.
 
As observações de satélite mostram que, antes de 2010, estes níveis estavam estáveis ou em crescimento desde meados dos anos 90, quando a monitorização da poluição desde o espaço começou nesta região.
 
Infelizmente, estes resultados têm como pano de fundo a fuga em massa de milhões de cidadãos, sobretudo na Síria. “A geopolítica e conflitos armados no Médio Oriente alteraram profundamente as emissões de poluentes do ar”, explicou no jornal Science Advances o professor Jos Lelieveld, diretor do Max Planck Institute for Chemistry, na Alemanha.
 
De 2005 a 2010, explica Jos Lelieveld, o Médio Oriente foi uma das regiões com maior crescimento de emissões de poluentes do ar, um facto relacionado com o crescimento económico de muitos dos países que o compõem. Desde então, porém, esta é a única região do globo em que a tendência de aumento da poluição foi interrompida – e de uma forma muito acentuada.
 
A descida das emissões de dióxido de nitrogénio na capital iraquiana, Bagdad, ocorre desde 2013 e estará ligada à quebra da queima de combustíveis fósseis e agricultura. Uma tendência idêntica, na verdade, à ocorrida em Egipto durante a chamada Primavera Árabe, em 2011. Noutras partes da região, como a Arábia Saudita, Kuwait e Emirados Árabes Unidos, a descida da poluição deve-se a outra razão: a introdução do controlo de qualidade do ar.
 
Na Séria, as emissões de dióxido de nitrogénio em Damasco e Aleppo decresceram entre 40 a 50% em 2011, coincidindo com o início da Guerra Civil – que ainda decorre. Por outro lado, ocorreu um aumento entre 20 a 30% das emissões de dióxido de nitrogénio no Líbano, para onde terão viajado 1,5 milhões de refugiados sírios.
 
Curiosamente, a análise chegou também à Grécia, onde os níveis de dióxido de nitrogénio estão em quada há duas décadas. Na verdade, esta tendência acelerou nos últimos anos, com a crise económica – só em Atenas, a capital, estas emissões decresceram 40% desde 2008.
 
“Infelizmente, o Médio Oriente não é a única região do globo afectada pela recessão económica e guerra, ainda que estas mudanças geopolíticas sejam ali mais drásticas que em qualquer outro lado. É trágico que algumas tendências negativas de dióxido de nitrogénio estejam associadas a catástrofes humanitárias”, concluiu o professor alemão.
Foto: Игорь М / Creative Commons

Portugal: rola-brava e zarro passam a estar em risco de extinção

Green Savers  02/11/2015
A última actualização da Lista Vermelha das Espécies em risco de extinção inclui,pela primeira vez, espécies cinegéticas que são caçadas em Portugal. A rola-brava e o zarro são agora espécies consideradas em risco de extinção, na categoria “Vulnerável” o que, segundo a SPEA (Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves), demonstra a urgência de alterar a legislação de caça em Portugal e noutros países onde estas espécies ocorrem.
 
Das 77.340 espécies avaliadas pela Lista Vermelha, 22.784 estão ameaçadas de extinção e no grupo das aves em particular, mais de 40 espécies viram o seu estatuto de conservação agravar-se. É o caso da rola-brava, uma ave migradora que ainda é caçada em Portugal, apesar de programas de monitorização levados a cabo pela SPEA demonstrarem um decréscimo de cerca de 40% no seu número, na última década.
 
Também o zarro, da família dos patos, é uma espécie cinegética migradora com diminuições drásticas nas suas populações. “Com base nestes dados, a SPEA não tem dúvidas que ambas as espécies devem deixar de ser caçadas como medida de conservação, o que requer uma reacção rápida e eficaz das entidades oficiais através da alteração do calendário venatório e da suspensão da sua caça”, explicou a associação.
 
Os principais grupos de aves que mostram agravamentos no risco de extinção são os abutres, as aves marinhas e as aves limícolas, algumas delas ocorrem em Portugal e requerem medidas de conservação urgentes.
 
Em Portugal existe uma espécie em risco crítico, que o país partilha com Espanha: a pardela-balear, e outras três “em perigo”. Nos últimos tempos, outras viram a categoria de ameaça diminuída graças a esforços de projectos de conservação, entre as quais o priolo e a freira-da-madeira.
 
Ainda assim, existem sete espécies com o estatuto de conservação urgentes: a águia-imperial, o painho-de-monteiro, a abetarda, a freira-do-bugio, a felosa-aquática, e as novas espécies que agora entraram na lista, a rola-brava e o zarro.
 
A Lista Vermelha das espécies em risco de extinção é uma ferramenta criada pela União Internacional de Conservação da Natureza (UICN) em colaboração com a BirdLife International, em 1963, para avaliar com critérios objectivos qual o grau de ameaçada de extinção para cada espécie. Sabemos, assim, que existem 197 espécies em estado “criticamente ameaçado” de extinção, em todo o mundo.
Foto: Faísca / SPEA